Esta é minha primeira crónica para a 100% DJ. Apesar de gostar de o fazer, há algum tempo que não escrevia “em público”, desde as minhas várias Crónicas para a revista Dance Club que não o fazia, por isso espero não estar “enferrujado”. Espero conseguir transmitir algo da minha experiência adquirida ao longo de alguns anos a fazer parte da “Dance Scene” em Portugal (e estrangeiro) e que as minhas opiniões sobre os assuntos que eventualmente possa vir a abordar nestas linhas sejam vistas simplesmente como isso: uma opinião pessoal e como tal, subjectiva...
O primeiro assunto que achei interessante abordar nestas linhas é a importância da Música, hoje em dia, em alguns eventos de música electrónica. O que tenho constatado nos últimos anos é que em alguns dos eventos a Música tornou-se uma “coisa” (praticamente) secundária. Em alguns desses eventos, as pessoas estão mais pendentes das actividades “extra” dos DJ’s do que da Música que eles tocam, seja atirar objectos ao público, seja saltar em cama elástica, ou outro tipo de “iniciativas”, tudo vale para captar a “atenção” (?) do público e marcar a “diferença”. É verdade que alguns dos Top DJ’s internacionais neste momento têm mais peso do que algumas bandas, inclusive do que algumas já conceituadas, e que alguns desses eventos têm uma produção de som, luz e pirotecnia que há alguns anos atrás só estariam ao alcance dessas (mega) bandas, criando um espectáculo único. A evolução da produção em alguns dos eventos de música electrónica foi brutal nos últimos anos, consequência lógica da importância desta o que eu acho perfeitamente normal e positivo. Mas será que é necessário em alguns dos eventos, além de toda essa produção de som, luz e pirotecnia, os DJ’s terem que fazer alguma coisa “diferente” para “captar” a atenção do público? Não deveria ser a Música o principal factor, o principal motivo para as pessoas se deslocarem a um evento de música electrónica, sem estarem á “espera” de algo “fora do normal” da parte do DJ?
O que me causa estranheza é que algumas pessoas, em alguns eventos, dão mais importância a essas “actividades extra” do que à Música em si.
Já actuei em alguns (poucos) eventos com uma dinâmica desse tipo e senti que algumas das pessoas que lá estavam esperavam que eu fizesse algo “diferente”, além da música que estava a tocar. A produção trouxe-me um microfone (que gentilmente recusei) e uma plataforma para, se quisesse, subir para cima da cabine, coisa que também recusei. Obviamente não tenho absolutamente NADA contra isso, nem contra os artistas que fazem isso, até porque fiz ambas as coisas (usar o micro e saltar para cima da cabine), pontualmente, enquanto era DJ residente do Cais 447 (Matosinhos) entre 1992 e 1995. O que me causa estranheza é que algumas pessoas, em alguns eventos, dão mais importância a essas “actividades extra” do que à Música em si...
Não deveria ser SEMPRE a Música o factor mais importante, aquilo que faz as pessoas deslocarem-se dezenas, centenas e às vezes milhares de quilómetros para ir ouvir um DJ?
Obviamente que há (felizmente) muitos eventos onde isso ainda acontece (em Portugal, um dos melhores exemplos é sem dúvida o festival Neopop, em Viana do Castelo), mas também é verdade que nos últimos anos apareceram outro tipo de eventos onde a Música não é o mais importante, onde (praticamente) tudo é mais importante do que a Música, mesmo que o resultado final dessas “actividades extra” seja uma entrada nas urgências de um hospital, às tantas da madrugada, devidamente filmado para o canal de Youtube...
Será que já vale tudo para ter notoriedade (visualizações no Youtube, “likes” no Facebook, etc.) como DJ?
(Carlos Manaça escreve de acordo com a antiga ortografia)