É realmente muito complicado compreender e aceitar o momento pelo qual estamos a passar. Nove meses de indefinição em relação a tudo o que tenha a ver com as nossas vidas, pessoais e profissionais, nove meses subjugados a uma indiferença quase criminosa da parte de quem nos governa e um desprezo absolutamente insultuoso, no mínimo, por um sector que tanto deu ao nosso País. Como eu próprio, vejo colegas em grandes dificuldades, estabelecimentos a fechar, empresários desesperados por soluções que não chegam, a noite a ser cada vez mais uma lembrança que se desvanece num mar de memórias que parecem cada vez mais nubladas. É triste tomares consciência que após anos a tentar dar o melhor de ti ao teu País, incondicionalmente, quando pela primeira vez realmente precisas dele te apercebes que apenas serves para dar, mais nada. Quando num universo de 100%, tens conhecimento que apenas 2% das infeções deste maldito Vírus são em contexto nocturno, e mês após mês apenas vais tendo conhecimento que as medidas mais apertadas são continuamente para a Restauração, começas realmente a pensar que algo se move contra tudo aquilo pelo qual acreditaste e deste a tua vida durante anos a fio, suportando as cargas fiscais absurdas, condições de emprego absolutamente deploráveis, noites mal dormidas, viagens incontáveis, vida pessoal inexistente, enfim, tudo aquilo que fez com que Portugal seja cotado como um dos melhores destinos turísticos do mundo. DJs, músicos, bartenders, chefs de cozinha, actores, artistas dos mais variadas artes e muitos mais, todos nós sempre levámos o nosso País no coração para todo o lado, quer fosse para o bar do amigo ou para o melhor festival do Mundo. Somos pequeninos mas somos muito lutadores, um país de guerreiros, infelizmente comandados por um bando de cobardes.
Será que tinha custado muito pelo menos ter dado uma palavra de conforto, no meio destes nove meses que se passaram, a profissionais que tanto se sacrificaram por esta pandemia e que de quinze em quinze dias ficavam a olhar para a televisão apenas para ver se as palavras "bar" ou "discoteca" saíam da boca de um Primeiro-Ministro arrogante que se recusava quase sadicamente a mencionar estas duas palavras, de um momento para o outro tão mal vistas no nosso país?
Não percebo o sentido de ter a noite fechada antes mesmo de começar, não percebo o sentido de decretar um fim-de-semana de confinamento geral mas só após as 13h, não percebo o porquê de não nos deixarem trabalhar quando somos o sector que mais cuidados tem com a desinfecção de espaços, apenas provavelmente ultrapassados pelos Hospitais. Será que tinha custado muito pelo menos ter dado uma palavra de conforto, no meio destes nove meses que se passaram, a profissionais que tanto se sacrificaram por esta pandemia e que de quinze em quinze dias ficavam a olhar para a televisão apenas para ver se as palavras "bar" ou "discoteca" saíam da boca de um Primeiro-Ministro arrogante que se recusava quase sadicamente a mencionar estas duas palavras, de um momento para o outro tão mal vistas no nosso país? E como ficaram as milhares de pessoas que, de um momento para o outro, viram um País virar-lhes as costas como se fosse deles a culpa de uma situação da qual muito provavelmente são os menos culpados? Será bastante pertinente relembrar a quem tem a memória curta que o sector nocturno foi o primeiro a fechar no início desta Pandemia, e por iniciativa própria, convém não esquecer. Corta-me o coração que sejamos tratados como criminosos apenas porque queremos trabalhar mais uns minutos, apenas porque quem teve o poder de determinar como nos é permitido levar as nossas vidas acha que de um minuto para o outro, as coisas podem correr mal. A grande diferença é que para nós, um minuto a mais é mais uma possibilidade de conseguirmos sobreviver, sim, porque é a isso que se resume tudo isto, sobrevivência.
Que culpa temos nós que a esta Pandemia se junte uma guerra económica, social e absolutamente monopolizadora daquilo que são os nossos direitos fundamentais, que nos foram tirados sem qualquer tipo de explicação lógica? Que fique claro que eu, como todos os meus colegas, temos consciência que esta é uma guerra, é realmente perigosa e que tem que ser ganha por todos, mas terão que ser sempre os mesmos a serem lançados para a linha da frente? Que culpa temos nós que não haja controle nos transportes públicos ou que os lares tenham uma incidência de infecção assustadora? Que culpa temos dos ajuntamentos ilegais que tantas manchetes fizeram neste Verão? Que culpa temos nós da falta de pulso e coragem para evitar situações como festivais ou comícios políticos absurdos numa altura destas, comemorações religiosas, avistamentos de ondas, ou corridas de carros apenas porque não é conveniente politicamente? E como ficamos agora, já que não têm a quem culpar pelo aumento dos números, será que haverá uma ínfima possibilidade de tudo isto ter sido mal gerido e que a culpa possa ser também vossa, vocês que nunca se enganam? É que no meio de tudo isto que se passou neste últimos nove meses continuamos nós, seres humanos que apenas querem trabalhar, seja em que circunstâncias forem, para que possamos ter condições para viver, podermos alimentar as nossas famílias, os nossos filhos, termos uma vida minimamente digna.
Fiscalizem, sejam duros, confinem, façam o que for preciso para travar este vírus, mas façam-no de igual modo para todos, desde o cidadão que vai passear o periquito como desculpa para sair à rua, ao político que pensa que está acima da lei e organiza comícios ridículos e sem sentido apenas porque lhe é permitido.
Fiscalizem, sejam duros, confinem, façam o que for preciso para travar este vírus, mas façam-no de igual modo para todos, desde o cidadão que vai passear o periquito como desculpa para sair à rua, ao político que pensa que está acima da lei e organiza comícios ridículos e sem sentido apenas porque lhe é permitido. Não estejam sempre a castigar aquele que já está no chão, pisado e quase sem capacidade para respirar. Não deixa de ser irónico, um sector que vivia de proporcionar diversão a todos, seja o que menos vontade tem de sorrir actualmente, mas a vida é feita de injustiças, a isso estamos habituados. Ao que não estamos habituados é a sermos ostracizados e discriminados de uma maneira inaceitável e inexplicável. Pensava que já tínhamos passado essa fase há uns bons anos atrás. Só queremos trabalhar, dentro dos moldes que forem seguros para nós e para os nossos clientes, estamos dispostos a tudo, como aliás temos feito no pouco tempo que nos é permitido fazê-lo. Digam-nos, por favor, um sector que tenha investido tanto na segurança, que seja tão profissional na abordagem à pandemia e a todos os cuidados que se devem ter com o seu controle. Preocuparem-se com os cafés, pastelarias e outros é obviamente de louvar, manter-nos fechados e fazerem-nos passar pela humilhação de apenas podermos trabalhar se alterarmos um CAE soa a escárnio. Somos profissionais qualificados, dos melhores do mundo, ganhamos prémios internacionais, e até disfarçados temos que estar para podermos trabalhar? Assim já não faz mal?
Que País é este que despreza o que de tão bom tem apenas porque não tem a quem culpar relativamente a uma situação da qual ninguém tem culpa? Estamos aqui, queremos trabalhar, a horas decentes para o nosso sector, estamos dispostos a tudo, olhem para nós e digam-nos como querem que o façamos mas não deixem a Indústria Nocturna morrer, porque se continuar assim é o que vai acontecer.
À hora que escrevo esta crónica preparo-me para viajar mais de 200 quilómetros, não para trabalhar, como tantas vezes fiz, mas para me ir juntar aos meus colegas para juntos lutarmos pelos nossos direitos, algo que pensava que nunca mais iríamos ter que fazer após o 25 Abril. Apesar de tudo irei com todo o gosto e mais forte que nunca, porque apesar de tudo, tal como esses mesmos colegas, sou Português, daqueles a sério, que lutam, trabalham e olham uns pelos outros porque isso nunca ninguém nos vai tirar, até porque enquanto não nos derem ouvidos, estaremos aqui para vos dar luta.
Carlos Vargas