Diretor Ivo Moreira  \  Periodicidade Mensal
 
Quantas e quantas vezes, depois de um gig, não chegaste a casa ou ao hotel e ainda ouves um zumbido super agudo, que se torna incomodativo, parecendo por vezes que acabamos de sair de um voo de avião? Pois, sofreste de perda de audição temporária. Em princípio os teus ouvidos recuperam, mas com o passar do tempo e com a exposição constante à música demasiado alta, o mais provável é quando acabares a tua carreira de DJ já tenhas perdido grande parte da tua audição.
 
Bem, mas nem tudo está perdido:
 
1. Não bebas enquanto estás a tocar. Eu sei que é uma seca não beber enquanto se toca, mas na verdade o álcool faz com que o volume demasiado alto numas colunas de monição não seja perceptível, ou seja, quanto mais bebes, mais aumentas a monição e mais "estragas" os ouvidos - e nem sequer te dás conta!
 
"O álcool bloqueia especificamente as frequências mais graves, afectando numa maior escala as 1000 Hz, que é a frequência crucial para a perceção de um diálogo. Em conclusão, o álcool afecta a audição sendo que algumas frequências são mais afectadas que outras."
 
2. Desliga a monição entre as misturas. Basicamente, para os DJs a perda da audição não ocorre do ruído excessivamente alto, mas sim do tempo em que estamos expostos a esse ruído alto. Se estivermos atentos aos níveis da monição e se formos diminuindo o volume após cada mistura, os nossos ouvidos vão recuperando ao longo do set. Em suma, aumenta a monição o suficiente para conseguires fazer uma boa mistura e após a mesma, reduz a mesma de forma a que estas te permitam escutar a música não muito alta.
 
Para perceberes melhor do que falo, consulta este estudo que te vai ajudar a compreender os tempos máximos a que deves estar exposto a certos ruídos: http://www.cdc.gov/healthyyouth/noise/signs.htm.
 

(...) Uma vez que estamos expostos a música demasiado alta, o cérebro tem dificuldades em saber o que está alto ou não - e isto piora à medida que vamos tocando.

 
3. Usa um medidor externo de DB. Esta é aquela que nem eu próprio alguma vez fiz, mas convém referenciar. Uma vez que estamos expostos a música demasiado alta, o cérebro tem dificuldades em saber o que está alto ou não - e isto piora à medida que vamos tocando. Por isso, sem um medidor externo torna-se praticamente impossível de controlar o volume.
 
Existem algumas cabines que têm medidores de DBs para controlo da casa e dos próprios DJs. Outros podem usar leitores de DBs especializados ou então, através de apps para o telemóvel. Convém lembrar que os microfones dos telemóveis têm alguma dificuldade em captar as frequências mais graves e em distinguir níveis acima dos 100db.
 
Os níveis recomendados de escuta, em 3 situações diferentes são:
  • 100 dB num festival ao ar livre;
  • 103 dB num clube com um pé direito baixo;
  • 106 dB num clube com uma acústica péssima.
 
Após a mistura, é recomendado que se mantenha a monição nos 90 dBs.
 
4. Proteção feita à medida do nosso ouvido. Esta é a mais cara, mas a mais simples e a mais duradoura. Desde que tenho os meus "custom earplugs" que nunca mais senti aquele zumbido nos ouvidos após um gig. Aliás, já chego aos clubes com eles postos e só quando saio é que os tiro - e parece que nem estive exposto a barulho nenhum. Em Portugal podem fazer um molde personalizado na GAES e eu recomendo o filtro atenuante ER-15.
 
Ficam aqui as minhas recomendações para que consigam manter a vossa audição durante o maior tempo possível. Para os DJs/Produtores isto é essencial, porque com o passar do tempo e com a exposição prolongada a volumes excessivamente altos, chegamos a uma altura em que no estúdio deixamos de ouvir certos sons e as músicas depois começam a sair desequilibradas.
 
Boas Mixes! :)
 
Daniel Poças
FY2 - The Party Rockers
Publicado em Daniel Poças
terça, 04 julho 2017 22:50

Algarve: destino de festa

A noite algarvia é um tema recorrente na minha vida, perguntam-me frequentemente por ela – como é? Como está? E por aí em diante – especialmente quando vou em tour para o Brasil, país irmão e cheio de curiosidade pela cena portuguesa.
 
Nasci e cresci no Algarve, e com mais de 20 anos como DJ foi no Algarve que tive as primeiras oportunidades da minha carreira. Essas oportunidades aconteceram em espaços que fazem hoje parte da história e são referências quando se fala da dance scene nacional. A primeira de todas foi como DJ residente do bar Mitto, em Albufeira, que se tornou lugar de visita obrigatória para todos as pessoas influentes na noite de Lisboa e Porto que iam sempre lá no início da noite. Com a palavra a passar e uma clientela conhecedora da música e do meio, o meu trabalho no Mitto resultou num convite para tocar em algumas noites do Capítulo V, um club único, com um glamour e uma clientela selecionada a dedo, e que não voltou a repetir-se na cena nacional.
 
Algum tempo depois, em 1998, fui convidado para ser DJ residente da Locomia, que vivia os seus anos de ouro que ficaram inscritos na história da electrónica nacional. Ali, na cabine com vista para a Praia de Santa Eulália, pude tocar com praticamente todos os nomes de referência da dance scene mundial tanto do techno (que fazia as festas de sexta-feira), como do house (aos sábados). Partilhar a cabine com vultos como Deep Dish, Erick Morillo, David Morales, Richie Hawtin, Jeff Mills, ou Frankie Knuckles, entre muitos outros.
 
O Mitto, o Capítulo V e a Locomia foram as minhas escolas musicais, naquelas cabines aprendi tudo sobre a arte de ser DJ, da comunicação com o público ao trabalho de fazer, com ele, uma viagem musical e, em última instância como a política musical constrói uma casa.
 
Escrever sobre o Algarve sem mencionar a Páscoa é quase impossível. No final dos anos 90 e início dos anos 2000, as férias da Páscoa eram obrigatórias ser passadas no Algarve. Nessa altura do ano as casas do Norte do país assentavam arraiais no Algarve e havia uma sucessão louca de festas com nomes nacionais e internacionais de referência. Vejo as festas à tarde na piscina da Locomia como a pré-história dos sunsets de hoje. Recentemente tive oportunidade de rever o Little Louie Vega, e não é que ele se recordava de lá estar a atuar com Masters at Work?
 

Vejo o fenómeno dos sunsets como uma alternativa muito saudável e inclusiva – permite que todos, independentemente da idade, possam frequentar a festa.

 
O que nos ficou desses tempos em que a Páscoa era no Algarve, e não num Spring break na costa espanhola, foram os sunsets. Apesar desta perda para Espanha – e os operadores turísticos deviam pensar em relocalizar as celebrações dos finalistas para o Algarve – tudo se tem vindo a transformar, e surgem novos espaços que apesar de existirem apenas 20 a 30 noites entre Julho e Agosto, trazem novidades a cada noite enriquecendo a cena nacional.
 
Vejo o fenómeno dos sunsets como uma alternativa muito saudável e inclusiva – permite que todos, independentemente da idade, possam frequentar a festa. Por ser durante o dia e porque as pessoas que estão na praia são “seduzidas” pela música que os DJs tocam em alguns espaços nas mais diversas praias algarvias. As pessoas acabam por se agrupar perto destes "beach points", e ficam a dançar e a curtir até para lá das 22h.
 
As festas nos barcos também eram, e continuam a ser, muito procuradas. Apesar de terem uma vertente e um público mais alternativo são momentos únicos e espetaculares que o Algarve continua a oferecer. Aqui destaco as que participei com a subida pelo Rio Guadiana em que o barco que fazia a travessia de pessoas pra Espanha, saía de Vila Real de Sto. António, e regressava ao final das tardes de verão.
Fui acompanhando sempre muito de perto as tendências e mudanças dos mais variados espaços no Algarve, como algarvio de gema, e há muitos anos que realizo um sunset em parceria com o grupo No Solo Água, que começou em Vilamoura e em 2011 ganhou a designação por que ficaria conhecido até hoje: Infinity Sunset by Pete Tha Zouk.
 
Na segunda edição, ainda em Vilamoura, decidi saltar de paraquedas e aterrar numa praia da Falésia repleta de gente, 18 mil pessoas segundo as contas oficiais, e depois de aterrar fui conduzido à cabine onde toquei mais de 5 horas de set. Foi algo único, com a adrenalina no máximo, e absolutamente inesquecível na minha carreira de DJ.
Este ano marquem a data de 13 de Agosto nas vossas agendas, porque o Infinity Sunset by Pete Tha Zouk acontece no No Solo Agua da Marina de Portimão, com entrada gratuita e permitida a todos, para que juntos possamos fazer uma grande festa a dança na areia ou com os pés dentro de água. Até lá!
 
Pete Tha Zouk
Publicado em Pete Tha Zouk
terça, 15 março 2016 17:28

Moda de música ou música da moda

Começo por agradecer ao Portal 100% DJ pelo simpático convite de me juntar a esta prestigiada família.
Quando me convidaram para escrever esta crónica, pensei com medo, estando ciente de estar ao lado de tanta gente conhecedora da indústria, que eu não teria expertise suficiente sobre o assunto.
 
Confesso que pensei que deveria fazer como tantos famosos artistas mundiais o fazem… pedir a alguém que escrevesse e eu apenas dava o nome! 
 
Não cedi à tentação e escrevi apenas este texto como um... desabafo!
 
Lembro-me agora de uma troca de opiniões que tive nos finais dos anos 80 com o meu Pai, sobre um estilo musical que estava a dar os primeiros passos em Portugal: o House Music.
 
Nessa altura eu defendia a música gerada e difundida pelo "messias" Mr. Frankie Knuckles e que tinha como elemento característico a batida electrónica sempre acima dos 120 bpm. 
O meu Pai, amante de música e locutor de rádio nas madrugadas da Antena1, não compreendia como era possível alguém ouvir aquilo a que chamava “barulho” e pior... como era possível ainda alguém gostar.
 
Nessa altura, pensava eu: 
- O meu pai está mesmo velho, pois não compreende as novas tendências da música.
 
Hoje, passados anos, quando saio à noite nos principais eventos ou clubes mundiais, penso ao ouvir as músicas da moda:
- Como é possível alguém gostar disto?
 
Acredito que a minha filha pense também como eu há uns anos atrás que o pai coitado, já está velho e não entende nada sobre música moderna. 
 
Estou assustado com esta ideia, confesso! 
 
Será que estou mesmo a ficar velho e sem a capacidade de me atualizar musicalmente?
 
Penso então que talvez ainda haja uma possibilidade de me safar deste meu envelhecimento de actualização musical, peço então a vossa ajuda para refletirem comigo:
 
O agora auto-denominado EDM - (a que eu carinhosamente chamo “Música das Buzinas”). Começa logo pela usurpação de um nome - EDM
 
  • EDM - Electronic Dance Music é toda uma cultura de música de dança e electrónica e não apenas uma categoria dentro da pasta completa do House Music.
 
Aqui começa a minha reflexão sobre o que é a moda de música ou música da moda.
 
  • Nos anos 90 havia um estilo de música (EuroPop), que por tão frequentemente e quase que em exclusivo se ouvir nas feiras populares, até se utilizava a simpática denominação de música “carrinhos de choque”. 
 
A “Música das Buzinas” e enganosamente chamada EDM é na sua generalidade semelhante à música “Carrinhos de Choque”, sendo a sua construção sem grandes alterações na sua génesis musical e a aplicação de apenas modernos retoques de produção de máquinas que não existiam na altura.
 

Fico triste, pois acho que o House Music que eu defendi, se transformou apenas num espectáculo de estrelas Pop(…)

 
PLEASE, onde está então a novidade? Porque é que a música de “carrinhos de choque” era foleira na altura e está agora na moda movimentando milhões de seguidores?
 
A resposta a esta pergunta é quase tão difícil como saber o porquê de os carros brancos nessa altura serem chamados frigoríficos com rodas e agora até eu estar a pensar em ter um?
 
Ainda há pouco tempo, falei com um conjunto de reconhecidos coreógrafos que me disseram que era quase impossível hoje em dia, coreografar espectáculos com a “Música das Buzinas”. 
Então como é possível? Fica então a minha dúvida, se a base da música electrónica é fazer as pessoas dançar, como é possível ser difícil fazer dançar os coreógrafos?
 
Será que quando se diz que a máxima "nada se inventa e tudo se transforma", já esgotou o espírito de imaginar música realmente nova? 
Era necessário pegar em tudo o que era piroso há uns anos atrás, retocar, modernizar tecnologicamente e virar tendência?
 
Fico também rendido, quando me recordo que até eu próprio, no concerto dos Swedish House Mafia no Meo Arena, estava na pista maravilhado com o espectáculo visual e que dei por mim a pensar que a magia que ali estava a acontecer em termos técnicos, não era compatível com a possibilidade de os artistas poderem estar a tocar realmente, pois tudo batia perfeito: as explosões de CO2 com a batida, as imagens com os vídeos e os laser com os refrões que todos cantávamos, mas que isso afinal, ou seja a arte inicial dos artistas, já não era fundamental!
 
Fico triste, pois acho que o House Music que eu defendi, se transformou apenas num espectáculo de estrelas Pop e onde o marketing de comunicação do mundo actual, nos fez perder o gosto e a consciência própria do que realmente gostamos e ensinou-nos ou impingiu-nos a seguir tendências e conceitos que por muito que já tínhamos achado foleiro ou pimbas em determinadas alturas das nossas vidas, agora somos seguidores convictos.
 
Provavelmente eu, estou de facto, velho!
 
João Paulo Lourenço
Publicado em João Paulo Lourenço
Portugal tem sido nos últimos anos conhecido e reconhecido pela enorme paixão pelos espetáculos ligados à música.  Os portugueses gostam de consumir música, de encher salas de concertos e festivais de verão. Se no final do verão de 2015 havia dúvidas de que os portugueses “respiravam” música, com as constantes confirmações de artistas internacionais desde o final de Agosto que vão marcar presença em 2016, não há margem para dúvidas.
 
Com a presença de artistas internacionais em 2016 como Adele, Muse, Justin Bieber, U2, AC/DC, Florence and the Machine ou Bryan Adams (entre tantos outros...) com espetáculos a solo, está dada a garantia de que 2016 vai ser um ponto de passagem das principais tours internacionais. A questão que me ocorre quando penso na confirmação de uma artista como Adele, a maior artista internacional da actualidade, que esgotou duas datas do MEO Arena em poucas horas e que bateu todos os records de vendas é: onde anda o velho do Restelo que fala tantas vezes do Portugal dos pequeninos?
 
O facto de sermos o ponto de entrada para a Europa faz com que grande parte das tours dos maiores artistas internacionais passe por cá, mas sem a qualidade dos nossos produtores de espetáculos, a viagem durava mais uma hora e aterrava em Espanha. A premiação constante das principais produtoras de eventos quer a nível nacional quer a nível internacional, fez com que o reconhecimento que há muito se pedia acontecesse, e que a garantia de qualidade que sempre existiu “obrigasse” as principais agências internacionais a incluírem o nosso país na Tour. A música é actualmente uma das melhores formas para mostrar o nosso País.
 

A música é actualmente uma das melhores formas para mostrar o nosso País.

 
Em 2012 com a crise económica sentiu-se uma quebra de vendas de espetáculos e festivais de verão. A estratégia das principais produtoras de espetáculos passou, e bem, por chamarem a atenção de espectadores estrangeiros com um cartaz que captasse o interesse, através de um trabalho de RP intensivo nos principais países vizinhos ligados à música internacional (Reino Unido, Espanha e França). O Turismo, outro dos sectores com mais qualidade que o nosso país oferece, foi a plataforma de entrada. Passados quatro anos percebe-se que resultou, atendendo ao facto de cada vez mais estrangeiros marcarem presença nos principais festivais de verão no nosso país. O facto do preço dos bilhetes ser dos mais baratos da Europa, do Turismo de Sol e Mar (ao contrário do Reino Unido que é conhecido pela chuva e lama) e do cartaz ser dos melhores da Europa, faz com que estejam reunidas todas as condições para que tenhamos cada vez mais público estrangeiro nos eventos ligados à música.  
 
Um dos pontos mais interessantes para analisar com a quantidade de espetáculos que Portugal vai ter em 2016 nas principais salas é a repercussão que os principais festivais de verão vão sofrer atendendo ao poder de compra dos portugueses. As escolhas são mais que muitas, mas a carteira não aumenta, infelizmente. 
 
Outro dos pontos interessantes em 2016 para analisar é a mudança de paradigma da música em Portugal. Se é ponto assente que o EDM (Eletronic Dance Music) já teve melhores dias e que o Kizomba já não enche clubs como acontecia há um ano atrás, percebemos que, e felizmente, as coisas estão a mudar. O Hip-Hop e o RnB parecem estar a voltar ao que já aconteceu no passado, refletindo-se no aparecimento e confirmação da qualidade de muitos artistas nacionais e internacionais tanto em espetáculos a solo como nos principais festivais de verão. De salientar a estreia de Wiz Khalifa e o regresso de  Kendrick Lamar em Portugal este verão.
 
A verdade é que chegamos a 2016 com uma certeza: as agências e as produtoras de espectáculos nacionais estão a trabalhar melhor do que nunca, de uma forma cada vez mais séria e profissionalizada e com a garantia que o ano que se avizinha vai ser um dos melhores anos que Portugal já viu no mundo da música, a rebentar pelas costuras.
 
Hugo Dinis Silva
Publicado em Hugo Dinis Silva
sexta, 10 janeiro 2014 21:35

Qual é o teu estilo, DJ?

 
Falemos dos "estilos". Passam os tempos e cada vez se torna mais difícil defini-los, garanto-vos. Pelo menos definir o que é que este ou aquele DJ toca.
 
São raros, raríssimos os que se conseguiram manter fieis às suas ondas originais. Armin Van Buuren no trance, Carl Cox, Richie Hawtin, Adam Beyer, Marco Carola no tecno, Steve Aoki, Afrojack, Chuckie no electro mais acessível, e pronto, à excepção dos incontornáveis de que não falei (e ainda são alguns pelo mundo fora, "graça a Deus!")... por aí... o resto é tudo uma adaptação do que se ouve agora, do que se quer agora, do que faz mexer as pistas, do que as rádios e playlists online veiculam.
 
Acredito que uma das coisas que mais incomoda um DJ, hoje em dia, é por isso, a pergunta: "Então e qual é o teu estilo?" Irrita, porque todos nós temos, obviamente as nossas preferências. Podemos gostar de minimal, progressivo, tecno, puro house... mas obviamente, que se queremos trabalhar nos dias que correm, temos mesmo que nos adaptar e tentar, fazer a melhor "viagem" possível durante as duas ou três horas normais de um set, MISTURANDO, sim, misturando... estilos, sonoridades e fazendo até o que à partida os puristas te ensinam a não fazer... colar a "bota e a perdigota"... uma de house comercial, seguida de uma "electrozada" e a seguir um techouse bem metido.
 
É obra dura de fazer.  E aqui, a diferença de quem o sabe ou não fazer, tem a ver com o bom senso, o bom gosto, a coerência... dentro do que à partida seria incoerente.
 
É mais isso, do que  passar uma horas seguidinhas das batidas certinhas da onda com que nos identificamos. Porque aí, à partida, sabemos que não falhamos (tecnicamente é mais fácil, claro, porque não há o perigo de "picos" e porque estamos fechados e encantados com o que nos enche as medidas como artistas). Mas, a verdade é que... não falhamos para nós, mas para o pessoal que está lá na frente, a não ser que vá já completamente formatado a ouvir o "nosso som" (ui, e é tão bom quando isso acontece), eles querem é diversidade e que a tal viagem os surpreenda, encha as medida, que as músicas lhes sejam familiares na sua maioria. E até os tais "picos" que às vezes não seriam aquilo que para nós faria sentido... é o que se quer.  E a nós... ai ai… e a nós, DJs de casa cheia, resta a magia (que esperamos ser certeira) de conseguir fazê-lo sábia e energeticamente.
 
Falo por mim, que nunca fui adepta do comercial puro e duro e cada vez mais a ele tenho que recorrer. Porque assim as casas o exigem  (ou só tocaria em mini clubes e bares com cachets baixinhos e onde o público seria muito menor em número que nas discotecas e festas mais massificadas por este país fora) e porque mesmo os "grandes", os internacionais, que em tempos produziram sons que nos ficaram no coração e na memória cada vez mais se dedicam a criar tendências comerciais e que os outros seguem pelo mundo fora.
 
"E é assim que é"... o Amor à música eletrónica, como tudo na nossa sociedade, tem que ser readaptado. Pelo menos a forma de o transmitir. E aí volto de novo aos estilos. "Qual é o teu estilo, DJ?"... Acho que a resposta da maioria, se não é, deveria ser: "O que eu toco? Ou o que eu gosto?".
 

Qual é o teu estilo, DJ? Acho que a resposta da maioria, se não é, deveria ser: "O que eu toco? Ou o que eu gosto?"

 
Amigos... o estilo confunde-se com o local, com a carreira, com a imagem que têm de nós, com o party people que temos à frente, com a hora a que tocamos, com o tipo de evento. Eu, por exemplo, toco desde em eventos corporativos às 4 da tarde até ao pico da hora dos "chalalás" todos comerciais que é às 3 da manhã e até de vez em quando faço um ou outro after em que me estico com o tecno e electro menos acessível.
 
Além de tudo isto... é impressionante constatar as "modas" que tão rapidamente entram e saem de cena. Por exemplo, o ano passado o público mais novo, quase que inexplicavelmente (porque não fazia parte da sua cultura musical, foi sim uma moda passageira) exigia quase lado a lado com os temas comerciais do Avicii, Alesso e afins... o dubsetp para embalar uma noite bem bebida. Este ano que passou... foi o Afrobeat. Para todos. Brancos. Pretos. Na cidade. No interior. Mesmo que não tenham qualquer afinidade com a cultura africana... gostam de afrobeat e mais espantoso ainda... de Kizomba e Kuduro.
Pergunto-me o que virá este ano e que... fará esquecer o que ficou para trás e que já foi apagado no iPod, para ganhar mais espaço para músicas novas?...
 
Falemos de "estilos", comecei assim a minha crónica... Ou não. Falemos então da nova filosofia de DJ. Da forma de adaptação à pista. Da vontade que temos que fazer crescer em nós de continuar a pôr o público a dançar. Da arte que considero perfeito de oferecer "uma para nós" e "duas para o público" e da magia que já raramente acontece, mas que não é, obviamente impossível quando a comunhão entre eles e nós - os DJs - acontece e esta máxima passa a ser: "uma para nós", "uma para eles" ou até mesmo "todas para todos".
 
São noites dessas que ficam na nossa história pessoal e independentemente de ondas, estilos ou géneros são noites dessas que mantêm aceso o nosso amor por esta arte.
 
E... que este ano tenha umas quantas dessas. Desejo-o para mim e para vocês. E assim, nos cruzaremos, aí pelas estradas desse país, de clube em clube, com aquele sorriso de satisfação e realização de que tão bem conhecemos o puro feeling, e é cada vez mais raro.
 
Rita Mendes
Publicado em Rita Mendes
E aqui estamos nós, quase um ano e meio depois. É realmente uma prova de fogo esta pela qual nos estão a fazer passar. Milhares de live streamings nas redes sociais a custo zero depois, a vida e futuro dos DJs e de todos os que estão ligados ao setor nocturno permanece uma verdadeira incógnita. 

Cada vez mais uma incerteza, esta profissão tende em se manter viva à conta de todo um novo circuito, constituído por restaurantes e esplanadas dos mesmos, a fazer o nosso trabalho por aquilo que nos quiserem dar. Se antes já não era uma forma de sustento fácil, agora acabamos por ficar entregues nas mãos de um sector que obviamente não tem o mesmo grau de profissionalismo que permitiria a este sector artístico a dignidade mínima para poder exercer o seu trabalho, mas que neste momento tem a faca e o queijo na mão. A realidade é que dou por mim a não querer pensar muito naquilo que poderá vir a ser o futuro da minha profissão, pelo simples facto de não saber se existirá um. 

Completamente ignorados por quem governa e toma decisões no nosso país, acaba por ser frustrante olhar para trás e relembrar todo o passado recente, que envolveu sacrifícios e muito trabalho, mas que no presente não serve absolutamente para nada. Cada vez mais parece que o desejo de quem toma as decisões é passar a designar como restauração apenas os restaurantes, os grandes beneficiados com esta pandemia, uma vez que parecem ser, cada vez mais, os grandes meninos queridos do Governo. 

Pintados como os bichos papões de tudo o que de mal acontece neste país, mesmo sendo os únicos que se encontram encerrados desde o início de todo este enredo, sim, porque o insulto que nos fizeram, ao equipararem os bares e discotecas a meros cafés como forma de podermos trabalhar sem condições nenhumas para a nossa área vai ficar para a história, os bares e discotecas continuam a ser objecto de uma tentativa de aniquilação colectiva sem precedentes num estado de direito, sendo que a única coisa que podemos fazer é assistir de uma forma quase tortuosa, à destruição do trabalho de milhares de pessoas, sejam elas artistas, proprietários, profissionais de bar ou seguranças, entre muitos outros. 

A perseguição das forças policiais, com ameaças de autos de contra-ordenação  e discursos agressivos como se estivessem a falar com criminosos, apenas uma mão cheia de minutos depois do horário "permitido" por lei, torna-se não só insultuoso, mas cada vez mais revoltante, fazendo-nos sentir como marginais, mas daqueles que pagam as suas contas, impostos, seguranças sociais e todas as suas obrigações como qualquer português, tirando os da elite, é claro. 

É com muita tristeza que vejo que temos um Governo que não percebe que ao fecharmos o nosso sector em Março de 2020, o fizemos em prol da saúde pública, para bem de todos os portugueses, perdendo com isso milhares e milhares de Euros, perdendo basicamente a nossa independência financeira. Sim, nós fizemos um favor ao país, esta é a verdade! Semana após semana apenas a esperança nos vai mantendo lúcidos o suficiente, para podermos apenas continuar a ter mais esperança, enquanto assistimos a uma Europa toda a devolver a vida aos nossos colegas de sector. Ainda bem para eles, nada de confusões, mas é decepcionante perceberes que estás num país que não sabe reconhecer todos os sacrifícios que foram feitos por ele.

Assistimos a eventos políticos, privados e para a Europa ver onde tudo lhes é permitido, enquanto o nosso sector tem que permanecer quieto e sem se poder queixar muito. Muito sinceramente custa-me um pouco a perceber o porquê desta discriminação e autêntica indiferença, nenhum outro sector passou por semelhante situação na nossa sociedade. À hora que escrevo este texto, já nem me consigo lembrar da última vez que passei música, nem sei se alguma vez voltarei a passar, mas aquilo que sei com toda a certeza é que agora compreendo um pouco melhor tudo o que o meu avô me contava acerca dos tempos da ditadura em Portugal. A pior coisa que, como seres humanos podemos sentir, é realmente sentirmo-nos ostracizados, marginalizados e absolutamente condicionados naquilo que são os nossos direitos básicos como seres humanos. 

É triste olhar para este belo país que é Portugal e vê-lo tão feio, tão descolorido e mau. Enfim, ainda temos a nossa esperança, a esperança que um dia iremos acordar e todo este pesadelo terá desaparecido... ou não!
 
Publicado em Carlos Vargas
terça, 01 março 2016 20:53

Obrigação ou imposição?

Olá noctívagos, foi longo o tempo que passou desde a minha ausência neste meio editorial de temática noturna. O pedido de participação da 100% DJ estende-se desde longa data e várias foram as recusas, não por falta de interesse, não por falta do mérito neste editorial que merece desde sempre e cada vez mais o apoio dos profissionais da noite, simplesmente porque o meu rumo profissional foi-se afastando desde meio, nunca a 100%, mas a vida são portas que selecionamos, abrimos e fechamos no constante dia-a-dia. Atempadamente a 100% DJ fez o convite que foi aceite no momento, no entanto os dias passam a correr, as semanas e meses sem vermos vão riscando o calendário e dei por mim a 24 horas da entrega desta crónica. Não é fácil cumprir prazos editoriais, mas eu, confesso que abusei da boa vontade tão atempada por parte da 100% DJ. Com isto, dei por mim a pensar se escrever esta crónica seria uma obrigação ou uma imposição. A minha forma de escrita é direta e sincera, dito isto, a resposta não podia ser mais clara que, não é uma obrigação, nem é uma imposição, é o respeito pela 100% DJ, é o respeito pelos seus leitores.
 
Na noite há situações nas quais se aplicaria a mesma questão “obrigação ou imposição?”, ora vejamos, selecionemos uma das posições de profissionais mais aclamadas do sector, o DJ! É obrigação aceitar alguns trabalhos ou é imposto que o faça? É obrigação ter que tocar alguns temas ou é imposição? Focaremos inicialmente o primeiro ponto. O aceitar algumas datas, gigs, trabalhos, como acharem melhor expressão, vai depender muito da carreira do mesmo, do “estatuto” que o mesmo conseguiu ganhar, conquistar e alcançar. Um artista em início de carreira e completamente amador deverá aceitar todo e qualquer tipo de trabalho, é em prólogo do mesmo esta aprendizagem, o ganhar experiência, sujeitar-se mesmo àquelas casas que nada conhece e por vezes de pista vazia…
 
Um DJ em início de carreira mas já com nome “regional”, não diria que bloqueia casas que não são do seu interesse, mas não aceita caches ridículos, não aceita tocar numa casa que trabalhe com um estilo musical com que não se identifica, ou fora da sua zona de conforto; este modelo ambiciona alcançar mais degraus, patamares e estatuto, preocupa-se com cada passo que possa dar em falso, prejudicando o seu futuro.
 

(…) pedir uma kizomba, a um DJ bem definido na vertente Techno, House, ou mesmo EDM, seria no mínimo ridículo (…)

 
Por fim, temos o DJ de renome, e não, não falo de um estatuto “topo”, não falo do artista que já alcançou inclusive renome internacional, este, antes de aqui chegar esteve anos num “piso” que não é “carne nem é peixe”, no entanto é alguém com nome no mercado, é aquele artista que no mínimo quando é falado, quem não conhece, responde, “não sei quem é, mas já ouvi falar”. Este artista está num patamar em que se pode dar ao luxo de selecionar onde irá tocar, esta questão pode não só partir de pontos pessoais, como de uma questão de gestão de carreira, ou seja, não tocar repetidamente num raio de quilómetros dentro de um determinado tempo de modo a não cansar o mercado e por sua vez o seu nome. Esta gestão neste patamar é já muitas vezes feita por um manager ou um bom booker que tenha capacidade de aconselhamento. Aquando a chegada a este “estatuto” o artista jamais aceita tocar num evento, ou numa casa que não seja o seu estilo musical (já muito bem definido neste patamar), a título de exemplo, pedir uma kizomba, a um DJ bem definido na vertente Techno, House, ou mesmo EDM, seria no mínimo ridículo, e o próprio público com “dois palmos de testa” nem se atreveria a fazer este pedido, isto aquando conseguida a aproximação do artista, muitas vezes inalcançada já neste DJ.
 
“Estatuto” - palavra tão usada nas linhas anteriores, de ânimo leve, bem sei, trata-se de anos de trabalho, nos quais tantos ficam “à sombra da bananeira” e acabam por desistir.
 
Em suma, e tentando concluir sem me alongar este ponto, até serem “gente”, sejam humildes! Vivemos uma geração em que está na moda ser DJ, quem leva esta profissão a sério são poucos, o que torna tudo muito mais difícil. “Obrigação ou imposição?” - depende de ti!
 
A música, o género, as faixas! 
É aqui que se coloca a grande questão, a prova de fogo. Para bons entendedores, as linhas anteriores serviriam de resposta a este segundo ponto. No entanto, vivemos nos últimos anos a “geração Juke Box”, dou por mim a partilhar a cabine com profissionais, colegas, amigos, que são abordados constantemente ao longo da noite com pedidos de temas, géneros e autores. Ora… falemos do passado, a cabine do Disc Jockey não era inacessível ao público há 15 anos porque ele tinha mau feitio, era justo por situações como a descrita agora.
 

(…) um DJ, nomeadamente os residentes, tantas vezes esquecidos, e são quem exerce a função de melhor escola dentro da profissão (…)

 
Escuto entre conversas, entre amigos de profissão, entre profissionais por diversas vezes, que o público é limitado, pede sempre os mesmos temas! A questão impõe-se: devo ou não ceder a estes pedidos?
 
Serei obrigado? Sinto a imposição do público…
 
Como tudo na vida aplica-se o bom senso, o nem 8 nem 80, mas acima de tudo, se um DJ, nomeadamente os residentes, tantas vezes esquecidos, e são quem exerce a função de melhor escola dentro da profissão, um artista que toca numa casa de estilo misto e que acabou de tocar mais de 15 minutos de kizomba, muda o seu estilo para house ou qualquer outro, e eis que surge o “piolho” do público a pedir aquele tema da moda dentro do género “kizomba”, é óbvio que este pedido deve ser totalmente ignorado! 
 
Eis que se coloca a grande questão… “mas passado uma hora devo repetir? É uma obrigação? Ou é uma imposição?” Tantas vezes do público, tantas outras do gerente ou proprietário da casa. A resposta certa?! Gostaria de dizer que não! Não vão repetir um tema que acabaram de tocar, MESMO HÁ UMA HORA ATRÁS! Lembram-se do bom senso? Eis a hora de aplicar o mesmo. Para obter a resposta, pensem, ou perguntem-se! Quem sou eu? Onde estou a tocar? Mas acima de tudo… quem está na pista? A noite é um negócio! A mercearia vende batatas, o banco notas e a discoteca bebidas, consumidas por quem vos ouve, sem eles, não és nada! É a eles que tens de agradar! Significa isso que tens de te repetir? Significa isso que tens de fazer um mau trabalho que não gostas nem consideras correto? Volta ao ponto 1! Em que patamar estás tu?
 
Obrigação ou imposição? Foste obrigado a colocar ou a tocar aquele género musical? Foi-te imposto aquele tema? 
 
Não! O bom senso! Tu mesmo deverás chegar à resposta do que foi certo naquele momento. Naquela casa. Naquele gig. Naquele momento da tua carreira! Mas acima de tudo, o que o público estava a sentir.
 
Mais que um profissional, és um educador musical. Não o fazes por obrigação, não o fazes por imposição. É a profissão que escolheste, é isso que queres ser?
 
Ivo Bacelar
Publicado em Ivo Bacelar
domingo, 10 março 2019 19:50

O Mercado DJ em Portugal

Ao contrário do que muitos defendem, acredito que o mercado nacional de música ainda tem muito a ganhar com artistas DJ nacionais. Que Portugal é um País com bastante talento musical já todos sabemos, nomeadamente na música eletrónica. 

O que é que está a mudar? Noto que grande parte dos artistas DJ já faz uma coisa que era impensável pela maioria no passado: Adaptam o estilo de música ao espaço/publico onde irão atuar. Há uns anos era quase um "crime" dizer a um DJ para tocar os géneros X ou Y, porque o "artista" tinha um estilo musical próprio e não se iria adaptar e "trair" o seu género musical ou "estragar" a sua imagem, ao adaptar-se musicalmente. 

Felizmente o tempo veio mudar algumas mentes mais teimosas e fê-los perceber: O que um evento quer é manter o máximo de tempo possível os clientes a divertir-se e satisfeitos. A maioria dos DJs tem de entender: Há eventos específicos onde o seu género musical é "rei" e aí não faz nenhum sentido adaptar ou fugir à essência que o define como artista. O problema é que estes eventos não são, para já, a maioria, e os eventos de massas têm pessoas que gostam de géneros díspares, desde Funk ao Rock...

O que é que esta mudança está a causar? Já podemos ver muitos eventos "Festas Anuais da Região X" a contratar artistas DJ em detrimento das típicas bandas ou artistas de música popular. Reparem, o que os eventos querem é diminuir ao máximo os seus custos, aumentando a satisfação dos participantes. Um DJ cobra 25% do que qualquer banda/artista de música popular, e não tem uma comitiva composta por meia dúzia de pessoas, ou mais. Há 5 anos era quase impensável que as comissões de festas, compostas geralmente por várias pessoas com mais de 40 anos, procurassem contratar DJs e estar a par desse segmento de mercado. Hoje em dia a mentalidade mudou.

Na DO HITS Agency, felizmente, conseguimos antecipar esta tendência. Nos últimos anos criámos conceitos, projetos e aconselhámos artistas parceiros a seguir o caminho que achávamos mais correto. Temos neste momento vários projectos DJ, não só ideais para eventos com um público-alvo específico, mas também variado (Feiras, Festas Regionais, etc.). No final ganha o evento, ganham os artistas DJ e criam-se mais oportunidades para ainda mais artistas DJ singrarem no mercado nacional. 

E por favor não cometam um erro habitual: Não se preocupem com a opinião dos outros "colegas DJ" por adaptarem musicalmente e tocarem géneros trending. Interessa sim o feedback do público e de quem contrata. Lembrem-se, se ninguém vos ouvir, é impossível criarem seguidores ou uma marca. Um DJ pode, ou não, ter uma vertente de produção musical, mas é impossível ser considerado DJ se não atuar ao vivo. 

PS: Gostei muito de assistir a Karetus a passar a música do Toy, ainda no início do verão. Quando há qualidade, até musicas "da moda" se sabe utilizar e adaptar ao seu público-alvo.
 
João Casaleiro
CEO Agência DO HITS
Publicado em João Casaleiro
sexta, 17 março 2017 21:21

O DJ toca ou passa música?

De vez em quando nas redes sociais vejo umas trocas de ideias mais acesas sobre esta questão. Há muitos anos atrás os DJs usavam normalmente a expressão “vou ali passar música...”, mas de há uns anos para cá, essa expressão transformou-se em “vou ali tocar...”. Qual das duas maneiras é a mais correcta para referir-se ao mesmo acto?
 
De um lado temos os músicos (e alguns músicos que também são DJs) que dizem que o DJ se limita a “passar a música dos outros”, do outro lado temos os DJs que dizem que não só tocam as músicas dos outros (ou as suas, caso sejam também produtores musicais) mas que também criam sonoridades novas, quando estão a actuar...
 
Sinceramente, acho que as duas afirmações estão correctas. É verdade que antes de aparecerem as novas tecnologias, as várias aplicações e controladores que agora podemos usar nos “sets” as possibilidades de criação eram muito mais limitadas, mas mesmo assim havia DJs que mesmo só com pratos e discos em vinil praticamente criavam novos temas, novas versões de temas, “remixes” na hora, com vários temas a tocar ao mesmo tempo. Lembro-me assim de repente do DJ Americano Jeff Mills a actuar dessa forma e na minha opinião isso é “tocar”, não é simplesmente o acto de “passar música”. Quem já assistiu a uma actuação dele a 4 pratos sabe do que estou a falar.
 
É verdade que nessa altura eram mais os casos em que o DJ “passava música” do que os em que “tocava”, mas mesmo assim usando “só” dois, três ou quatro pratos era possível (e alguns faziam-no) criar novas sonoridades, criar novos temas a partir outros já existentes. Isso não era a regra geral, é verdade, mas alguns DJs faziam-no e muito bem. 
 
Na minha opinião, hoje em dia é mais normal, por tudo o que usamos nas actuações, o termo “tocar” do que “passar música”. Ainda mais no caso daqueles DJs que praticamente só usam temas próprios e/ou “loops” e bases próprias e alguns temas de outros artistas num programa como o Ableton Live, criando sessões exclusivas com sonoridades novas, que muitas vezes até resultam em temas novos.
 

Com tudo o que temos à disposição neste momento para usar durante as actuações o limite é a nossa imaginação e criatividade!

 
Hoje em dia, com um computador portátil e um programa como o Traktor da Native Instruments (ou outro do género) é muito mais fácil conseguirmos criar uma versão nova, um momento “exclusivo” num set que provavelmente não se vai repetir noutro local. A Native Instruments até criou um formato exclusivo, os “STEMS” que basicamente são a divisão de um tema em quatro pistas separadas. Isto permite uma grande liberdade criativa já que podes usar o instrumental de um tema, uma voz de outro, um baixo de um terceiro e um sintetizador de um quarto e criar uma versão completamente nova de algo já existente ou mesmo um tema original, dependendo da tua imaginação! Isto já era também possível com o formato “Remix Sets” que a Native criou antes e que permite ter os temas divididos por “loops” para poder usar em diferentes combinações, mas com os STEMS penso que a facilidade em criar novas sonoridades é maior e mais imediata. 
 
Por isso, na minha opinião, a discussão entre se o DJ “passa música” ou “toca” é mais uma discussão “estéril”. Tal como dizer que “o verdadeiro DJ é aquele que não usa SYNC” ou “o verdadeiro DJ usa discos em vinil, não usa computadores...” entre outras discussões que de vez em quando aparecem nas redes sociais. Com tudo o que temos à disposição neste momento para usar durante as actuações o limite é a nossa imaginação e criatividade!
 
Carlos Manaça
 
(Carlos Manaça escreve de acordo com a antiga ortografia)
Publicado em Carlos Manaça
quarta, 03 dezembro 2014 18:58

O caso holandês

 
A questão da nacionalidade na música electrónica de dança deveria ser pouco importante, o que importa é a música e a quantos agrada sem olhar a fronteiras ou barreiras, afinal a grande conquista da electrónica é a democratização do acesso à música. No entanto é impossível não reparar no domínio de um pequeno país europeu, que tem crescido sustentadamente ao longo da última década, a Holanda. A maior evidência é o domínio do Top100 da DJ Mag, o ranking que serve de referência à indústria mainstream. Quatro dos DJs do Top5 mundial são holandeses, e se alargarmos para o Top20, metade são holandeses. A representatividade holandesa não tem par noutra nacionalidade e é um verdadeiro fenómeno. Se olharmos com mais um pouco de atenção verificamos que esta é apenas a ponta do icebergue. Grandes editoras são holandesas (a Spinnin; a Revealed; a Armada, entre outras); grandes produtoras de eventos são holandesas (a ID&T, responsável pelo Tomorrowland e pelo Sensation, por exemplo; ou a Alda Events, responsável pelas tours mundiais de Hardwell e Armin Van Buuren). A maior conferência anual é de organização holandesa e realiza-se em Amesterdão, o Amsterdam Dance Event. Mas como é que um pais tão pequeno consegue um peso tão significativo numa indústria mundial? Será algo na água que bebem? Ou será um fenómeno mais complicado de explicar?
 

O peso da música electrónica na economia holandesa é de 587 milhões de Euros por ano (...)

 
Comecemos esta análise pelo principio: os holandeses são porventura o único povo que tem estudos de impacto económico da indústria da música electrónica desde o início do século XXI. O primeiro estudo publicado data de 2002 e foi realizado pela consultora KPMG. O mais recente data de 2012 e foi executado pela consultora EVAR, e foi um dos documentos imprescindíveis a este texto1. O peso da música electrónica na economia holandesa é de 587 milhões de Euros por ano, ou seja, mais de meio milhar de milhões. Para este valor global contribuem as receitas dos DJs e produtores musicais, que ultrapassam os 254 milhões de Euros; os festivais e eventos que contribuem com uma fatia de 137 milhões de Euros; a recolha de royalties que ascende a 53 milhões de Euros; A organização de eventos a contribuir com 35 milhões de Euros; entre outras fontes de receitas que ascendem a uns impressionantes 587 milhões de Euros. Como se os números não falassem por si, esta é uma área de negócio em expansão mundial pelo que é expectável que cresça mais nos próximos anos. Uma estimativa cautelosa do mercado mundial dos eventos relacionados com a música electrónica cifra-se nos 2,7 mil milhões de Euros. E o que é que isto significa? Que os holandeses tiveram desde muito cedo a noção de que esta era uma indústria que poderia vir a ter tanto peso na economia do país como condições para crescer exponencialmente no futuro. 
 
Com esta ideia em mente o governo holandês teve o golpe de vista de acarinhar a música electrónica, de a reconhecer, de lhe dar um lugar de destaque na cultura e de criar um sistema de apoio, directo e indirecto, a toda a indústria. Um exemplo claro, e ímpar, desta integração e aceitação? Armin Van Buuren em 2013 a actuar no Kingsday (feriado nacional para celebrar o aniversário do Rei) ao lado da orquestra The Royal Concertgebouw: 
 
 
Outro grande exemplo do investimento na música electrónica foi a criação de uma conferência em 1996 - o Amsterdam Dance Event (ADE) - financiada pela Buma/Stemra (a Sociedade de Autores Holandesa), numa altura em que existia apenas a Winter Music Conference (WMC) de Miami. Focando mais a parte profissional e diurna do negócio, o ADE conseguiu destronar a WMC da sua posição de maior conferência mundial, e tornou a WMC de Miami uma opção, e o ADE de Amesterdão uma obrigação anual para qualquer profissional da indústria. 
 
Além desta óbvia integração dos DJs na cultura do país realizam-se no Kingsday vários eventos de música de dança públicos em todas as grandes cidades holandesas (Amesterdão, Roterdão, Haia, Utrecht, etc) feitos em cooperação com o governo local porque há um entendimento da parte de quem tem o poder público que estes eventos atraem pessoas e geram receitas. Ainda no campo do apoio existem várias organizações de caridade como a Unicef, WWF, War Child (Dance 4 Life), que são parcialmente financiadas pelo governo e que organizam diversos eventos, entre os quais eventos de EDM, para chamar a atenção para as suas causas.  
 
Por último, mas não de somenos importância, os estudos dos músicos e produtores também são apoiados através de financiamento estatal. Qualquer estudante holandês, em função das suas condições de vida pode pedir um apoio estatal até 400€ mensais e, desde que termine os estudos no tempo mínimo e sem falhar nenhuma disciplina, não tem que devolver o dinheiro que recebeu ao Estado. 
 

O caso holandês é um case study mas deveria ser também um exemplo a seguir por outros países.

 
Já ouviram falar de outro país que tenha algo de remotamente semelhante em termos de apoio, integração e valorização da cultura da música electrónica? Eu também não. Parece-me que podemos excluir a hipótese da água.
 
É evidente que sem talento nada se faz, pelo que há um valor artístico no caso holandês que não pode ser medido, e que é a variável nesta equação. Contudo a expressividade dos números da representatividade holandesa na indústria da EDM mundial é directamente proporcional ao investimento de uma nação, não só em apoio financeiro e institucional mas também em aceitação de uma forma de arte e cultura tão vanguardista (sim, porque ainda há quem discuta o valor de um produtor musical versus um músico instrumentista) que permanece na sombra na maioria das culturas mundiais apesar da crescente exposição e da conquista da pop mundial. 
 
O caso holandês é um case study mas deveria ser também um exemplo a seguir por outros países. 
 
(1) "Dance-onomics - The Economic Significance of EDM for the Nederlands" - EVAR Advisory Services, October 2012
 
Thanks Celwin Frezen for the Dutch insider input, couldn’t have done it without you!
 
Um agradecimento especial a toda a equipa e artistas da WDB Management pelo input valioso que dão a todas as minhas crónicas.
 
Sónia Silvestre
Brand Manager
WDB Management
Publicado em Sónia Silvestre
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