Diretor Ivo Moreira  \  Periodicidade Mensal
segunda, 02 maio 2022 22:05

Tudo na mesma

Depois de dois anos de pandemia que forçou a uma paragem da actividade do entretenimento nocturno e eventos, o regresso veio trazer o que já se esperava - ficou tudo na mesma. 

Apesar dos esforços de inúmeras pessoas, onde associações foram criadas com investimento pessoal, numa tentativa de municiar os DJs das ferramentas necessárias para o seu reconhecimento profissional, as dificuldades foram encontradas dentro da própria "comunidade DJ". 

Rapidamente foram esquecidas as "queixas" de falta de apoios sociais, a inexistência de "voz" junto das entidades competentes, o reconhecimento da profissão e o auxílio para todos aqueles que iniciam ou que já exercem mas não têm o conhecimento de situações em que verbas que são suas por direito ficam nas mãos de terceiros.  

A desconfiança natural por parte da maioria dos DJs é justificada com o passado, onde várias associações foram criadas com intuitos poucos claros ou onde visavam o lucro, mas nem com o aparecimento de associações sem fins lucrativos, onde os associados não pagavam quotização, com estatutos claros e onde todos os associados tinham direito de apresentar candidatura aos orgãos sociais, tiveram uma recepção por parte desta comunidade para poderem oferecer o que os DJs tanto "reclamam" mas que pelos vistos não pretendem ter...

Foi uma oportunidade perdida e basta olhar para o modelo Holandês para perceber que há (havia) uma oportunidade única que podia levar à internacionalização do produto português e internamente munir os DJs de ferramentas que permitisse darem passos em frente nas suas carreiras.

Ao invés disso, agências e agentes (como eu) passaram a canalizar os seus esforços para outras áreas dentro da música, eventos e entretenimento e dezenas (para não dizer centenas) de DJs e produtores de música electrónica vão ficar pelo caminho ou com maiores dificuldades, havendo mesmo um decréscimo acentuado na contratação para eventos não especificados onde os DJs tinham o seu espaço e que foi ocupado por outro tipo de artistas e estilos musicais. 

Não há culpados (cada um é livre de fazer o que entender) mas há responsáveis e essa responsabilidade não precisa de ser assumida mas está imputada a quem deixou ficar "tudo na mesma". 
 
Ricardo Silva
Agente Artístico e Empresário
Publicado em Ricardo Silva
terça, 10 novembro 2015 00:03

Top 100 DJs: como deverias chegar ao topo

 
Começo por felicitar os dois Portugueses que se mantiveram no TOP 100 - mais um ano em que Portugal está, e bem, representado no top e a na minha opinião o Diego Miranda (#58) e o Kura (#61) são os DJs/Produtores nacionais (do circuito 'comercial') que mais trabalharam a nível internacional este último ano e por isso fico feliz ao ver que o seu trabalho foi recompensado.
 
Analisando a DJ MAG, é preciso ter em atenção que de há uns cinco, seis anos para cá se tornou um top de popularidade versus investimentos e que, dentro de todos os estilos de música e de DJing, na minha opinião, apenas incide dentro do comercial - até porque são esses os DJs que fazem campanhas de votação. Não vemos os DJs do 'underground' (Exemplo: Seth Troxler, Jamie Jones, Dubfire, etc - só para referir alguns, dentro das centenas de excelentes produtores e DJs) preocupados com as votações nem a fazer campanha. Alguns até fazem comentários a ridicularizar o top, mas se não fazem 'campanha', acabam por ser ultrapassados por outros, se calhar não tão bons DJs ou produtores. Claro está que, para muitos DJs, o lugar que ocupa na DJ MAG representa mais ou menos concertos ao longo do ano e ainda um aumento ou diminuição de cachet.
 

O lugar que ocupa na DJ MAG representa mais ou menos concertos ao longo do ano e ainda um aumento ou diminuição de cachet.

 
Esta premiação é um negócio para a DJ MAG e possivelmente é o que sustenta a revista, já que toda a gente a conhece mas contam-se pelos dedos as pessoas que algum dia a abriram, folhearam ou compraram. Como o voto é feito através do Facebook, criaram uma base de dados dos votantes com todas as preferências que o Facebook partilha. Inclusive, surgiram rumores por parte de alguns DJs internacionais que a DJ MAG exige a compra de uma página de publicidade para poder figurar no top.
 
Na minha opinião, a forma mais justa de avaliar quem deveria estar no top 100 da DJ MAG seria com uma contagem de venda de bilhetes ao longo do ano, número de músicas vendidas aliado à performance enquanto DJ - mas como isso é praticamente impossível e a DJ MAG é por votação, vão sempre haver surpresas nos resultados e discordâncias no público em geral, que não imagina as jogadas de bastidores que são feitas, mas ainda assim, ficam revoltados. Para mim este não é um top real do panorama mundial de DJs e produtores de todos os estilos, fica-se apenas no circuito 'comercial' - como o top do resident advisor (que se calhar o pessoal do 'comercial' não conhece) também não é um top real porque se foca em DJs do 'underground'. Ambos valem o que valem.
 
Em relação aos últimos resultados da DJ MAG, no que fui acompanhando nas diversas redes sociais, o que me quis parecer foi que o sentimento de revolta foi superior aos anos anteriores - é normal que o público em geral esteja surpreendido com os resultados da votação, uma vez que muitos artistas reconhecidos internacionalmente não lideram a tabela e ficaram em posições mais distantes do topo ou nem sequer entraram no top 100. O top 20 não me faz confusão e nele figuram os artistas que previa, independentemente das posições. Os resultados mais surpreendentes são os do meio da tabela com artistas consagrados em posições muito longe do top 50 e a perder o lugar para DJs que não têm esse reconhecimento, quer no meio artístico quer junto do público. Hoje em dia os resultados não são um reflexo real do sucesso e trabalho em produção musical, vendas de bilheteira, número de plays, tops de vendas de música ou de performance de palco. 
 
Dan Maarten
Publicado em Daniel Poças
segunda, 16 maio 2022 15:10

Para onde caminha a Noite...

À medida que a pandemia parece estar cada vez mais para trás, a necessidade de capitalização das empresas sobrepõe-se a tudo o resto. Cada vez mais reparo que não interessa muito o que se passa dentro do clube, desde que o mesmo esteja cheio. É pena este tipo de mentalidade, pode parecer estranho, mas acho mesmo que perdemos uma excelente oportunidade para mudar o paradigma da noite no nosso país. Durante a pandemia dei por mim várias vezes a pensar que no meio de tudo o que de mal nos estava a acontecer, pelo menos uma coisa boa seria o facto de todos podermos fazer uma auto-análise que nos permitiria ver como estávamos e víamos as coisas e de que forma as poderíamos alterar. Não resultou...

Independentemente dos gostos musicais de cada um, que podem ser próprios ou por imposição de uma máquina comercial completamente desprovida de consciência, a população mais jovem vai-se perdendo num vazio musical e pessoal onde o que conta é a aparência e a irreverência, seja lá isso o que for para eles. Claro que se pensarmos nisto numa forma mais profunda, por muito que custe ouvir, a culpa começa em casa, como é óbvio, mas para não me desviar do propósito desta crónica, é realmente assustador tentar perceber por onde andará a música dita "comercial" nos próximos tempos, se tomarmos em linha de consideração o que se está a passar agora.

Pelo caminho que as coisas estão a tomar, é óbvio que, salvo raras exceções, cada vez iremos ver menos deejays convidados a pisar as nossas cabines, ou pelo menos nacionais, uma vez que se é para se ser irreverente e cool, que seja em grande, por isso tem que ser internacional, para assim seguir a tendência do mercado. Se queremos ter um público cool e irreverente, temos que os educar dessa forma. Ao menos vejo aqui alguma coerência, há que admiti-lo!

O grande problema actual para qualquer artista nacional com personalidade e identidade musical é que se analisarmos friamente isto tudo com uma perspectiva única e exclusivamente virada para o imediato, obviamente que não faz sentido, do ponto de vista empresarial, estar a contratar um deejay com vontade própria por uma razão muito simples. Se o objetivo é injetar dinheiro na empresa, porquê estar a pagar muito dinheiro, quando praticamente pelo mesmo que se paga a um profissional de segurança podemos ter uma noite absolutamente garantida e não correr riscos? É óbvio que este tipo de pensamento, numa primeira análise rápida, nos faz elogiar os dotes empresariais de qualquer gerente de espaços nocturnos.
Mas infelizmente o que não estamos a conseguir perceber são as consequências que tudo isto vai causar na noite em termos futuros, no seu ambiente, na sua segurança, na forma como todos os profissionais da noite vão poder fazer o seu trabalho, em resumo, na essência da noite.

Na música, muitas vezes ouvi dizer que enquanto o artista mandava na indústria, as coisas iam fluindo. A humanidade artística e a singularidade humana dos mesmos mantinha tudo arrumado nos seus sítios. o problema foi quando a indústria começou a mandar no artista. Uma indústria que não olha a meios para atingir objectivos, que não tem sentimentos, qualquer tipo de amor ou criatividade para dar, uma indústria que apenas vê uma coisa, números. Da mesma forma, também a noite sempre ditou as regras nos clientes, regras essas que eram invioláveis, e que faziam com que a noite fosse especial, com uma mística e um mistério associados até a um ligeiro medo por quebrar certas barreiras, o que de uma forma muito lógica, mantinha o equilíbrio.
 
Mas o tempo passou, e as mentalidades mudaram. Infelizmente parece-me que também na oferta nocturna os papéis se inverteram. Os clientes passaram a mandar na noite. Vamos ver como vai correr... Ou muito me engano ou provavelmente num futuro próximo os protagonistas da noite mais bem remunerados terão que ser mesmo os seguranças, e com muita tristeza digo que uma noite sem segurança, visão de futuro e uma forma de estar comandada de dentro para fora não me parece muito próspera. Espero estar enganado.
 
DJ & Produtor
Publicado em Carlos Vargas
segunda, 19 março 2018 19:36

O que fiz para estar onde estou

A música é o que nos faz ser DJs? 

Todos sabemos que hoje a indústria da música eletrónica atravessa um período de mudança - o que é bom para uns e maus para outros. Em todas as formas de arte há tendências, o público segue-as e dependemos do público para "vingar" neste ramo. A música tem um período de consumo muito mais rápido se comparado a anos passados. Não me quero alongar nesta questão, mas há forma de contornar isso? 

A minha carreira de DJ/Produtor começou há 6 anos atrás. Nunca imaginei poder trabalhar com grandes artistas, nem lançar em grandes editoras como Lokosound ou Revealed. Para mim era sem dúvida algo muito distante, sobretudo olhando para o estado do mercado: muito saturado de demasiada informação desnecessária e com escassez de música. Será que se perdeu o que realmente me fez passar horas agarrado ao computador? 

Já tive muitos fracassos, e já ouvi muitos “nãos” e ainda acontece - porque acontece a todos - mas as “derrotas musicais” não se superam com uma foto no Instagram, nem tão pouco com likes. De certo que sobe a auto-estima e que alivia o processo de focagem noutro passo. 

Estou a dar a minha opinião, não quero discordar de ninguém que diz o contrário. Claro que todos nós sabemos que as redes sociais têm um peso enorme na carreira de um artista e que hoje talvez até tenham mais peso do que a própria música. Isso não significa que precisamos de deixar de ser produtores para ser modelos - a música, como já disse, é e sempre será o mais importante. 

"Não digo que as redes sociais devem ser postas de parte, porque eu mesmo não as ponho (precisamos delas para promover o nosso trabalho e dar-nos a conhecer ao público), estou a dizer que a maneira mais fácil de não sermos postos de parte é não por de parte a música." 

 

É importante ter um Manager/Agente? Ou será mais importante ter uma equipa?

Uma das lições mais importantes que aprendi ao longo destes anos em que sigo no ramo da música, é a que temos de ser nós a “bater com a cabeça” para ver o que está mal e com quem não devemos trabalhar. 

Eu trabalhei desde sempre com o Miguel. O Miguel não é agente, nem manager, não tem formação na área: trabalha em restauração. Mas a vantagem de trabalhar com o Miguel é que ele me conhece: as fraquezas, as forças, os dias bons e maus. E o mais importante é que ele acredita tanto no "ZINKO" como eu. Por isso acredito solenemente que a formação de uma equipa forte, com base na credibilidade do projecto e na confiança mútua é um ponto-chave para tudo funcionar.

Hoje em dia sou agenciado, sim, e tenho alguém "do outro lado". Tratamo-nos como equipa, delineamos estratégias e caminhos para chegar onde queremos. Mesmo que não consigamos, amanhã tentamos novamente. 

Quem quer que escolham para a vossa equipa nunca tratem a pessoa como alguém que está a trabalhar para vocês, mas sim que está a trabalhar convosco. A importância de ter um manager ou agente passa a não ter nexo se não se tratarem como equipa. "Nenhum treinador consegue ganhar campeonatos sem jogadores", é uma mensagem simples, mas que para mim faz toda a diferença. Eu sei quem não estaria onde estou agora, talvez até mesmo a escrever um texto de opinião, se não tivesse uma equipa a trabalhar comigo. 


Enviar Promos

A parte mais importante do artista passa obviamente pela música. Podemos cada vez mais potenciar a mesma e fazê-la chegar aos ouvidos de quem queremos. O envio de promos é algo muito importante no momento em que temos uma "nova música", mas é importante termos um método adequado e prático para o fazer.
 
Alguns pontos que tenho notado quando recebo as promos no meu e-mail.
 
1 - Apresentação 
Acho que ninguém gosta de ser abordado sem uma apresentação do que vai ouvir antes - nome, idade, país, breve descrição -, mas não é preciso alongar ao ponto de escrever uma biografia inteira. Artistas como Hardwell, Afrojack, ou Martin Garrix não estão minimamente interessados se vocês têm uma casa à beira-mar, ou se o vosso cão se chama "Rex". Uma breve descrição e o link da música chega perfeitamente. 

2 - Links
Nenhum artista dos que falei há pouco vai fazer download do vosso ficheiro, por isso acho que o mais prático será enviar um link privado de Soundcloud com download activo, ou link de Dropbox. A falta de pré-escuta é um ponto crucial para a música não ser ouvida. Passados 5 ou 6 emails com anexo, o que enviarem será considerado spam,  perdendo-se boas oportunidades de serem ouvidos, porque a vossa música podia estar boa.

3 - Música
Têm de estar certos de que o que estão a enviar é o melhor que conseguem. Nunca sabemos se o artista a quem enviamos a promo vai ouvir ou não. Por isso é óbvio que um ponto que todos devem considerar é que músicas inacabadas, sem mix/master, entre outros problemas, provavelmente não vão ter feedback ou se tiverem não vai ser o que gostariam de ouvir. Isso faz com que nós fiquemos desmotivados.

Processo Criativo / Mixing e Mastering
Neste tópico certamente não há muito para dizer, pois cada um tem o seu formato de trabalho e as suas manias. Não vou falar de nada que quem faz música não saiba, contudo acho importante referir alguns pontos. Não são precisas colunas topo de gama para fazer música. Não é preciso um estúdio de milhares de euros, não é preciso um teclado midi super atual e cheio de controladores, pois a maior parte das minhas músicas foram feitas de fones, teclado do computador sentado na mesa da minha cozinha. 

É tudo uma questão de conforto. Ter um espaço organizado é o ponto, não tem de ser o espaço nem a altura, acho que naquele momento tem de se estar completamente focado no que se está a fazer - esse é o truque -, obviamente que um bom computador e um bom equipamento ajuda, mas não é o mais importante. O mais importante é sim conseguir passar a ideia da cabeça para o software. 

A música não tem tempo para se fazer, eu tenho músicas com dois anos que sofreram alterações durante esse espaço de tempo até ter o produto final com que me sinto satisfeito. A minha faixa “Footprint” em colaboração com o “Tong Apollo” saiu em novembro de 2017, a ideia da música ficou pronta ainda em 2016. Mudámos tudo, 4 drops diferentes até chegarmos ao resultado final. Já a “Guaraná” demorou três dias a ser feita e consegui assiná-la numa das maiores editoras do mundo. O que importa na realidade é a ideia. Claro que uma ideia bem executada só tem a ganhar. 

Tentar fazer algo diferente não é nada fácil, eu sei disso, sei que fazer algo num estilo muito ouvido - Big Room, por exemplo - mas que não soe genérico é complicado. As labels procuram cada vez mais ideias novas, para criar tendências, algo novo, que não se ouve no mercado. É isto que chama a atenção dos A&R´s, a meu ver é tudo uma questão de ideias e alguma sorte. 

Depois existe a segunda parte, talvez das coisas mais importantes, pode parecer que não faz diferença, mas faz: o Mix/Master é algo que vai finalizar a música. Por vezes sem darmos conta é o que falta, aquele pormenor que não sabemos o que é.  Eu pago esse serviço: https://wiredmasters.co.uk/. Não sou profissional da área, ainda estou a aprender e a pouco e pouco é algo que se vai encaixando no ouvido, pois também tem a ver com o gosto de cada um. 

Sei que é um entrave para muita gente, porque são preços que não são acessíveis a todos, e por isso é aconselhável que o investimento seja numa música que valha a pena, porque como disse há pouco faz toda a diferença.

Gostava mesmo muito que este texto ajudasse a malta, isto é só a minha opinião. Não fiz nem mais nem menos que outros artistas, eu trabalho assim e estou a partilhar alguns dos meus métodos com vocês. Todos os erros de que falei acima eu já os cometi. Não me arrependo de forma alguma, serviram para aprender e a acreditar cada vez mais na minha música. Todos os dias trabalho nisto porque acredito. Espero que vocês partilhem este pensamento. Assim será muito mais fácil que nós, amantes de música, tenhamos um maior sucesso e que levemos o nosso país fantástico além-fronteiras pelo que mais gostamos de fazer.
 
Zinko
Publicado em Zinko
sábado, 17 outubro 2015 22:33

“To sync or not to sync”

Este é um tema sobre o qual recebo algumas perguntas nas minhas redes sociais e que até agora não tenho comentado ‘publicamente’ nas minhas crónicas. Tem havido algum debate sobre este assunto (que felizmente abrandou nos últimos tempos), mas de vez em quando volta a ocupar muito espaço nas redes sociais e fóruns. E há posições totalmente ‘extremistas’ quer de um lado, quer do outro!
 
De um lado, surgem aqueles que defendem exclusivamente a utilização dos pratos pelos DJs, o vinil como suporte musical, renegando outros suportes ou sistemas digitais como meio de ‘distinguir’ os ‘verdadeiros DJs’, desqualificando aqueles que não o fazem.
 
Do outro lado, temos os que dizem que o “vinil está totalmente desactualizado” e “fora de moda” e que os que usam os sistemas como Traktor, Serato (ou outros) é que estão ‘à frente’, muitas vezes catalogando de “antiquados” os DJs que ainda usam exclusivamente (ou quase) o vinil como formato. 
 
É verdade que o avanço da tecnologia, a divulgação e popularidade de sistemas como o Traktor e o Serato, veio permitir a muitas pessoas de outras áreas e que não tinham qualquer passado como DJs, actuarem em clubs ou eventos, uma vez que a sincronia entre as músicas é relativamente fácil com estes sistemas digitais. Até ao aparecimento destes sistemas, o ‘beat matching’, o acertar de batidas entre dois (ou mais) temas, era quase uma ‘arte oculta’ para as pessoas ‘normais’, ou pelo menos era uma tarefa que demorava algum tempo para ser aprendida, o que levava a que só alguns se aventurassem a tentar fazê-lo. 
 

Com a mediatização que o papel do DJ teve nos últimos anos, era normal que houvesse este aumento repentino no número de DJs.

 
Com a mediatização que o papel do DJ teve nos últimos anos, era normal que houvesse este aumento repentino no número de DJs. Se a tecnologia permite uma maior facilidade no djing, era só uma questão de tempo até muitas pessoas, que até aí nunca tinham entrado numa cabine, tentassem a sua sorte.
 
Esta repentina ‘invasão’ de DJs no mercado veio despertar o ‘fundamentalismo’ de alguns, defendendo que só através do vinil (ou CD’s - embora os últimos leitores de CD da Pioneer também já tenham o botão SYNC) se pode apreciar o ‘verdadeiro DJ’, uma vez que com um computador portátil “qualquer um pode ser DJ”. Houve até alguns clubs em que chegaram a proibir os ‘sets’ com Traktor ou Serato e cancelaram alguns artistas que os usavam.
 
Acontece que o ‘beat matching’ é só um dos factores que um (bom) DJ tem que dominar num set... A verdade, é que em todos estes anos já ouvi grandes sets em vinil, em CD (sem SYNC) com Traktor (ou Serato) com SYNC e também já ouvi alguns não tão bons em todos estes formatos... Por isso digo e repito, ser DJ não é só saber acertar batidas, sincronizar dois ou mais temas simultaneamente. 
 
Há muitos outros factores que contribuem para um grande (ou mau) set. Saber usar a mesa de mistura, os volumes, conhecer os temas que se vão tocar, perder horas a procurar/selecionar a música que se vai usar, ‘organizá-la’ para um set (não gosto da expressão ‘programar um set’, porque acho que isso não se programa) saber criar momentos, manter o público a dançar durante duas, três ou mais horas, não é tarefa fácil... E isso não vem incluído nos programas que permitem o SYNC dos temas.
 
É verdade que nos últimos anos se assistiu a uma aproximação de alguns top DJs às ‘playlists’ usadas pelas rádios. Não tenho nada contra isso, até porque esses artistas movem milhares de pessoas e enchem clubs, eventos e festivais. Mas esse factor - o facto de um DJ set de muitos top DJs ser composto de muitos temas que tocam nas rádios generalistas, aliado à facilidade que a tecnologia veio trazer, fez com que muita gente que até agora nunca tinha pensado em passar música entrasse no ‘circuito’ de DJs em Portugal (e não só). E isso veio criar alguns preconceitos contra o uso de laptops no DJing…
 

Sinceramente não tenho saudades da altura do vinil, até porque foram muitos quilómetros e horas a carregar malas de 120 discos.

 
Na minha opinião, o que conta realmente é a MÚSICA. Se esta é transmitida através de vinil, de CD’s, de um programa, de que forma for, é o resultado final do set que me importa. Se o DJ consegue fazer-me dançar durante uma, duas, três horas, se gosto da música dele, não me interessa qual o formato em que ela me chega... Tive o prazer de estar horas ao lado de DJs que só usaram dois pratos Technics e fizeram sets INCRÍVEIS, mas também assisti a alguns sets de DJs que montaram dois computadores portáteis, uma Maschine (uma caixa de ritmos da Native Instruments) dois controladores X1 da Native Instruments, uma caixa de ritmos, entre outras coisas e o resultado final não foi tão bom como outros DJs que usaram só os dois pratos...
 
Não tenho qualquer problema em usar o SYNC nas minhas actuações com o programa Traktor. Se a tecnologia está aí, não vejo o porquê de não a usar. Sinceramente não tenho saudades da altura do vinil, até porque foram muitos quilómetros e horas a carregar malas de 120 discos. Mesmo que agora decidisse voltar a usar só o vinil, a maior parte das cabines dos clubs ou eventos já não estão preparadas para esse formato e iria ter problemas em conseguir temas de alguns artistas que neste momento só existem em formato digital.
 
É óbvio que quando chegas a um club ou evento e vês uma parafernália de equipamento montado para o DJ actuar, visualmente isso cria alguma expectativa. Mas no final, o que interessa é a capacidade desse DJ te levar numa ‘viagem’, fazer-te dançar, fazer-te ‘explodir’ num momento, fazer-te abrandar noutro momento e conseguir que vibres com a sua música. E isso pode acontecer tanto com um artista que usa dois (ou mais) pratos e discos em vinil (ou CD) sem SYNC, como com um DJ que usa um programa como o Traktor, (ou outro) com SYNC. Na minha opinião, o que interessa é o resultado final e não o método para o alcançar...
 
Carlos Manaça
 
(Carlos Manaça escreve de acordo com a antiga ortografia)
Publicado em Carlos Manaça
terça, 05 setembro 2017 17:49

Eu ainda acredito

Acabou o verão (leia-se Julho e Agosto) e regressamos a outra realidade para os DJs Portugueses. Voltam a olhar para os clubes/discotecas como a sua fonte principal de rendimento, depois de dois meses em que puderam pisar palcos por todo o país.
 
Estamos claramente na mudança para um novo ciclo da música electrónica onde apenas alguns conseguirão manter-se no mercado. Durante vários anos vimos o aparecimento de “fornadas” de novos DJs (peço desculpa pelo uso da palavra) e rapidamente perceberam que ser DJ não é tocar uma playlist de um PC e de um controlador ou produzir música com uns samples “sacados” da net e fazer umas coisas num programa pirata. 
O mercado está a mudar novamente e "o DJ" perdeu imenso do espaço que tinha conquistado nos últimos cinco anos. 
Os palcos perderam a necessidade de fazer um cartaz repleto de DJs que nada de novo trouxeram ao mercado nos últimos três anos. Um formato "gasto", baseado no "show off" e utilização excessiva de "efeitos especiais" que deviam servir de "complemento" e tornaram-se na própria actuação, relegando para segundo plano o principal - a música. 
 
Quem conseguiu perceber "o caminho certo" foi quem conseguiu manter e afirmar-se. Os Turntablists, DJs de Hip Hop e principalmente os DJs com sonoridades mais "clubbing" (House, Techouse, etc.) conquistaram o seu espaço por mérito próprio e temos assistido a um crescimento de festivais e eventos com essas sonoridades por todo o país e com uma autêntica legião de seguidores.
 

Durante vários anos assistimos à degradação da profissão de DJ por culpa própria.

 
Ninguém consegue prever o futuro mas tudo indica que vamos ter um novo ciclo onde a "música de fusão" pode ser a única alternativa para todos aqueles DJs que quiseram afirmar-se com estilos que "só servem" para festivais e com uma produção gigantesca em torno da actuação. Querer actuar em clubes/discotecas regularmente e massacrar os clientes com Big Room e Electro deixou de fazer sentido (excepto se o evento ou temática for adequada).
 
Durante vários anos assistimos à degradação da profissão de DJ por culpa própria. Qualquer um era DJ. O dono da casa, a malta que saiu dos Reality Shows, as figuras públicas que não tinham trabalho, o desempregado que achou que era fácil, o "modelo" que ficou velho e ficou sem trabalho, o "puto" da escola preparatória que queria ser o David Guetta ou as "raparigas ou rapazes" que queriam ser "famosos" e que para eles a música não era o importante.
 
Dizer a alguém "sou DJ", deixou de ser algo que era dito com orgulho. Deixou de ser aquela pessoa que tinha cultura, conhecimento musical, a pessoa que tinha capacidade para "mexer contigo" durante 5 ou 6 horas para passar a ser um indivíduo que mete uma playlist durante 1h00, dispara uns confetis e CO2 e vai para casa com o ego em alta a pensar que é o melhor artista do mundo.
 
Perdeu-se o principal... A MÚSICA.
 
O DJ deixou de o ser para passar a ser um mero "entertainer". Alguém que "não precisa" de ter "skills", alguém que não "arrisca" e testa novas músicas e sonoridades. O DJ é alguém que é uma cópia de outro DJ que tem mais sucesso que ele. O DJ deixou de ser um "educador musical" para ser uma "jukebox" em que ele lá estar a ser pago pelo serviço que presta ou uma caixa onde inserimos moedas e escolhemos o que queremos ouvir é a mesma coisa.
 
Eu ainda acredito que há esperança para a profissão tão nobre que é ser DJ. 
Acredito que vai piorar antes de melhorar mas que os DJs voltarão às cabines e deixarão os palcos onde tocam playlists. Acredito que o verdadeiro DJ ainda existe e está apenas "adormecido" e a aguardar que esta fantochada termine. 
Eu ainda acredito nos verdadeiros DJs.

Ricardo Silva
DWM Management
Publicado em Ricardo Silva
domingo, 17 março 2019 16:41

Valores

Este tema é algo que até mesmo eu não sei expressar a 100%, mas vou falar-vos um pouco dos valores que devemos considerar válidos e no limite da humildade, e também dos cuidados que nós artistas devemos ter em conta quando nos propomos a um público. 

Todos sabemos que a música eletrónica entrou na "moda" há alguns anos, e, consequentemente o número de DJs/Produtores/Sonhadores/Amantes aumentou ao longo desde esse período. 

No contexto artístico onde estou inserido, já me deparei com inúmeros casos onde o artista elabora enormes riders hospitaleiros, com direito a camarim de luxo, bebidas de marcas caras, toalhas PRETAS, entre outras tantas coisas... Perguntam-me "O que tens contra isso?" Respondo claramente que nada e considero que os artistas se valorizem e peçam aquilo que acham indispensável para o dia da sua performance. Mas será que depois na hora da atuação estão em condições de alguma coisa? Parece que alguns não compreendem que estão a tocar para o público, que estão a ser pagos e que têm de agir como qualquer contratado em qualquer outro serviço. Refiro isso porque há muitos artistas que antes da atuação bebem exageradamente, fazem uma vida de excessos antes de entrar em cena e depois "dá barraca".  O porquê de escrever sobre este tema não é nada contra quem o faz, porque sinceramente não me importo com o nível de atuação de A, B, ou C, escrevo apenas porque prentendo chamar a atenção dos excessos no meio onde estamos. Todos nós nos dizemos ser grandes artistas, falamos bem de nós próprios a toda a hora e considero isso positivo, no entanto é necessário fazer valer o que dizemos. Sinto até que seja um pouco imaturo não nos sabermos comportar dentro do nosso espaço de trabalho, a cabine. 

Para além disso, há ainda aqueles que não sabem ser educados com os colegas de trabalho, não me refiro a colegas/artistas, mas sim Técnicos de Som/Luz/Produção/Organização/Fotógrafos, etc... Sim, porque somos todos parte de uma comunidade! Comunidade esta em que precisamos uns dos outros para trabalhar, onde os artistas aparentam ter algum complexo com a comunicação, porque muitas vezes são mal-educados e chegam a ser desagradáveis para quem com eles está a trabalhar. 

"CAROS AMIGOS DJS, NÓS NÃO SOMOS REIS DE NADA, NÃO SOMOS ESTRELAS E O MUNDO NÃO GIRA À NOSSA VOLTA".

Entendam que não precisamos ser arrogantes para quem está a trabalhar. Temos espaço para ser artistas, músicos e na nossa cabeça até temos espaço para ser estrelas, mas acima de tudo devemos ser pessoas, e boas pessoas, porque só assim deixamos a nossa marca. Este é realmente um tema que me incomoda, não por viver isso na pele, mas porque já vi acontecer inúmeras vezes.

Nunca se esqueçam desta lista:
Sem Técnico de Som: Não ouvimos 
Sem Técnico de Luz: Não vimos
Sem Produção: Não comemos 
Sem Organização: Não recebemos 
Sem Fotógrafos: Não recordamos 
Sem Público: Não nada.
 
Zinko
Publicado em Zinko
sábado, 02 março 2013 17:44

Seleção musical

 
Hoje em dia quando saímos encontramos festas e clubes onde a "onda" musical é a mais variada possível. Essa mesma diversidade nem sempre é do agrado de todos. Mas a verdade é que essa variedade é um "mal necessário" bem-vindo, visto que os "gregos e troianos" saem por demais satisfeitos e realizados com essa "confusão" musical. No entanto, essa "estratégia" nem sempre é do agrado de todos pelo que os telemóveis começam (nessa altura) a voar na direção da cabine com sugestões e "exigências".
 
Todos os artistas poderão encarar isso como algo desanimador mas não o devem fazer. Qualquer DJ pode encontrar nesses momentos um forte fio condutor para se orientar numa boa leitura de pista. Aliado a isso vêm boas oportunidades de estreitar a relação com o público e/ou fãs.
 

Nem todos se podem dar ao luxo de passar o que realmente gostam em troca de um bom cachet.

 
Nós, 'FY2 - The Party Rockers', enquanto profissionais da área temos neste ponto um grande suporte para o nosso trabalho/projeto. A leitura de pista e a biblioteca musical diversificada são dois pormenores fulcrais na hora de "bombar" as pistas que encontramos no nosso caminho. Quilómetros de festas e eventos que nos desafiam a cada noite.
 
Claro está que as opiniões entre os DJs variam na hora de falar sobre este assunto. Mas iremos sempre cair na velha definição do que é realmente ser DJ. Nem todos se podem dar ao luxo de passar o que realmente gostam em troca de um bom cachet.
 
Por isso "caros colegas" sempre que torcerem o nariz neste tipo de situações fechem os olhos por momentos e lembrem-se que tudo tem uma vantagem, só temos que a encontrar no meio de toda a confusão de luzes, música e fumo.
 
 
Francisco Praia
FY2 - The Party Rockers
Publicado em Francisco Praia
sexta, 05 abril 2013 14:50

Mudam-se os tempos, muda-se o respeito

 
Passo bastante tempo em estúdio e esse facto permite-me estar também atento ao que se passa nas redes sociais e internet. Ora algo que me tem vindo a intrigar nos últimos tempos, é a tremenda falta de respeito e facilidade com que os mais novos (talentosos ou não) artistas, tratam os mais velhos (maior parte com "cartas mais que dadas").

Eu compreendo o entusiasmo de alguns jovens, que conseguindo "imitar" a sonoridade de alguns artistas internacionais, são colocados em pedestais por amigos "facebookianos", que sendo igualmente joviais, não medem a "crítica exageradamente positiva".
 
Todos sabemos que colocar um preview musical no facebook leva a que 90% dos comentários sejam positivos, por razões óbvias. Ora essa situação não demonstra a realidade do talento artístico. Pelo menos no caso dos jovens. Mas acontece que estes jovens "artistas" ficam deslumbrados e pensam que podem argumentar, criticar e achar que apenas o que fazem está correcto e é bom.

Esta é uma situação grave. O respeito é um dos alicerces da inteligência e bem-estar entre "nós", seres pensantes.


Presenciei, recentemente uma bárbara situação em que um importantíssimo produtor foi "gozado", criticado e "escovado", até ao limite. Por quem?! Pois, aí é que está! Por quem ainda não mostrou/provou nada. Por quem ainda não tem sequer argumentos de "venda" artística e acima de tudo, e mais grave, por quem, ao pé de quem criticou é muito pequenino.

Esta é uma situação grave. O respeito é um dos alicerces da inteligência e bem-estar entre "nós", seres pensantes. Opiniões são opiniões, e todos somos livres de as ter, de as dar. Mas a crítica, a crítica é algo diferente e quando é dada com malícia, torna-se falta de respeito.

Gozar um artista que até já pouco tem a almejar, vindo de quem tem ainda tudo a almejar, é sinceramente e desculpem a expressão, mentecapto!

Estes "jovens" esquecem-se que editar uma música nos dias de hoje, não tem sequer um terço do valor que era editar há dez anos atrás. Porquê? Porque hoje em dia não tem custos, porque hoje é facílimo chegar às editoras, porque hoje, se "te enganares" num release, dois dias depois podes lançar uma nova. Porque hoje o risco para as editoras é quase nulo. E porque hoje, hoje até o youtube te ensina a "criar um hit"!
Com isto não significa que o talento tenha deixado de existir, porque existe e bastante, mas esse, esse não precisa de anos para "dar o salto" e afirmar.

Tentar subir uns degraus, difamando o mais velho é feio e no facebook, todos vêem!

Penso que colocar os pés bem assentes no chão e olhar o futuro com entusiasmo e "ganas" é o melhor caminho para os jovens, mas sempre a respeitar o próximo e o mais velho, pois esse, foi o que abriu portas para o "sonho"!
 
 
Publicado em Massivedrum
E aqui estamos nós, quase um ano e meio depois. É realmente uma prova de fogo esta pela qual nos estão a fazer passar. Milhares de live streamings nas redes sociais a custo zero depois, a vida e futuro dos DJs e de todos os que estão ligados ao setor nocturno permanece uma verdadeira incógnita. 

Cada vez mais uma incerteza, esta profissão tende em se manter viva à conta de todo um novo circuito, constituído por restaurantes e esplanadas dos mesmos, a fazer o nosso trabalho por aquilo que nos quiserem dar. Se antes já não era uma forma de sustento fácil, agora acabamos por ficar entregues nas mãos de um sector que obviamente não tem o mesmo grau de profissionalismo que permitiria a este sector artístico a dignidade mínima para poder exercer o seu trabalho, mas que neste momento tem a faca e o queijo na mão. A realidade é que dou por mim a não querer pensar muito naquilo que poderá vir a ser o futuro da minha profissão, pelo simples facto de não saber se existirá um. 

Completamente ignorados por quem governa e toma decisões no nosso país, acaba por ser frustrante olhar para trás e relembrar todo o passado recente, que envolveu sacrifícios e muito trabalho, mas que no presente não serve absolutamente para nada. Cada vez mais parece que o desejo de quem toma as decisões é passar a designar como restauração apenas os restaurantes, os grandes beneficiados com esta pandemia, uma vez que parecem ser, cada vez mais, os grandes meninos queridos do Governo. 

Pintados como os bichos papões de tudo o que de mal acontece neste país, mesmo sendo os únicos que se encontram encerrados desde o início de todo este enredo, sim, porque o insulto que nos fizeram, ao equipararem os bares e discotecas a meros cafés como forma de podermos trabalhar sem condições nenhumas para a nossa área vai ficar para a história, os bares e discotecas continuam a ser objecto de uma tentativa de aniquilação colectiva sem precedentes num estado de direito, sendo que a única coisa que podemos fazer é assistir de uma forma quase tortuosa, à destruição do trabalho de milhares de pessoas, sejam elas artistas, proprietários, profissionais de bar ou seguranças, entre muitos outros. 

A perseguição das forças policiais, com ameaças de autos de contra-ordenação  e discursos agressivos como se estivessem a falar com criminosos, apenas uma mão cheia de minutos depois do horário "permitido" por lei, torna-se não só insultuoso, mas cada vez mais revoltante, fazendo-nos sentir como marginais, mas daqueles que pagam as suas contas, impostos, seguranças sociais e todas as suas obrigações como qualquer português, tirando os da elite, é claro. 

É com muita tristeza que vejo que temos um Governo que não percebe que ao fecharmos o nosso sector em Março de 2020, o fizemos em prol da saúde pública, para bem de todos os portugueses, perdendo com isso milhares e milhares de Euros, perdendo basicamente a nossa independência financeira. Sim, nós fizemos um favor ao país, esta é a verdade! Semana após semana apenas a esperança nos vai mantendo lúcidos o suficiente, para podermos apenas continuar a ter mais esperança, enquanto assistimos a uma Europa toda a devolver a vida aos nossos colegas de sector. Ainda bem para eles, nada de confusões, mas é decepcionante perceberes que estás num país que não sabe reconhecer todos os sacrifícios que foram feitos por ele.

Assistimos a eventos políticos, privados e para a Europa ver onde tudo lhes é permitido, enquanto o nosso sector tem que permanecer quieto e sem se poder queixar muito. Muito sinceramente custa-me um pouco a perceber o porquê desta discriminação e autêntica indiferença, nenhum outro sector passou por semelhante situação na nossa sociedade. À hora que escrevo este texto, já nem me consigo lembrar da última vez que passei música, nem sei se alguma vez voltarei a passar, mas aquilo que sei com toda a certeza é que agora compreendo um pouco melhor tudo o que o meu avô me contava acerca dos tempos da ditadura em Portugal. A pior coisa que, como seres humanos podemos sentir, é realmente sentirmo-nos ostracizados, marginalizados e absolutamente condicionados naquilo que são os nossos direitos básicos como seres humanos. 

É triste olhar para este belo país que é Portugal e vê-lo tão feio, tão descolorido e mau. Enfim, ainda temos a nossa esperança, a esperança que um dia iremos acordar e todo este pesadelo terá desaparecido... ou não!
 
Publicado em Carlos Vargas
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